A Covid-19 e o ensino superior

Depois de mais de seis meses de adoção das primeiras medidas de isolamento social no Estado de São Paulo, instituições educacionais de todos os níveis ainda convivem com um cenário de grande incerteza sobre a retomada de suas atividades presenciais, que estão previstas para retornar gradualmente a partir do dia 7 de outubro.

As indefinições sobre a reabertura das instituições educacionais são uma questão global a ser solucionada, apresentando série de dificuldades para o retorno de seu funcionamento. Por melhores que sejam as ferramentas e possibilidades de ensino e aprendizagem utilizadas para a realização de aulas e outras atividades remotas, ainda é impossível transferir toda a experiência de formação no ensino superior para a tela de um celular ou computador.

Na 13ª Carta de Conjuntura da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), tratei do tema das mudanças trazidas pela pandemia no ensino superior – disponível em www.uscs.edu.br/noticias/cartasconjuscs. Transformações que ocorriam em ritmo mais suave, como a virtualização dos processos de aprendizagem, se tornaram questões de prioridade máxima. A consultoria Educa Insights projeta, em estudo divulgado pela Abmes (Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior), que o volume de alunos em cursos on-line deve superar os matriculados no modelo presencial já em 2022.

A adoção do ensino a distância foi a tentativa mais comum no sentido de remediar as consequências do isolamento social que ainda estamos submetidos. No entanto, em um país como o Brasil, onde ainda persistem inúmeras desigualdades, essa solução atendeu apenas uma parte do público que frequenta o ensino superior no País.

Os questionários socioeconômicos, respondidos no ato de inscrição do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) nos últimos cinco anos, apontam que um em cada três estudantes não tem acesso à internet e dispositivos que possibilitem o acesso a programas de educação a distância. A análise aponta a dificuldade de universalização desse modelo educativo, gerada pelas dificuldades socioeconômicas e a precariedade da infraestrutura de telecomunicações em algumas partes do Brasil.

As faculdades e universidades privadas estão passando por problemas consideráveis para a sobrevivência pós-pandemia, principalmente as pequenas e médias instituições. O Semesp, associação representativa do setor, apontou em pesquisa recente que houve uma diminuição de 56% no número de estudantes matriculados em instituições privadas de ensino superior no País entre o primeiro e o segundo semestre de 2020. Uma situação de dificuldade acomete também as três universidades públicas paulistas (USP, Unesp e Unicamp), que sofrerão com a diminuição nos recursos de funcionamento, grande parte vinculada a um percentual da arrecadação do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) do Estado, de pelo menos R$ 1,2 bilhão.

Esse cenário do ensino superior, tanto no Brasil como em toda a América Latina, foi a base do documento Covid-19 y Educación Superior: de los efectos inmediatos al día después, elaborado pelo Iesalc-Unesco (Instituto para a Educação Superior na América Latina e Caribe), que apresenta um plano composto por três fases, destinadas ao enfrentamento das consequências da pandemia e de medidas de retomada de atividades: continuidade pedagógica através do ensino a distância, retorno das práticas pedagógicas presenciais de acordo com as indicações das autoridades de saúde e a estruturação de um modelo de ensino híbrido, que inclua presencial e virtual.

O instituto também apela aos países e instituições para que tratem prioritariamente da falta de equipamentos e conectividade, e defende a implementação de medidas compensatórias para apoiar o aprendizado de alunos desfavorecidos e a transferência de conteúdo curricular para formatos digitais, incluindo tutoria individualizada, formação de grupos de aprendizagem para nivelamento e oferta de atividades compensatórias.

O funcionamento pleno do ensino superior só virá com a descoberta de uma vacina ou medicamento que permita a retomada de suas atividades com o maior grau de normalidade possível. No entanto, é necessário que se aproveite esse momento para refletir sobre medidas que adaptem as faculdades e universidades para o que ainda está por vir, acompanhando as transformações que irão se consolidar a partir do próximo capítulo da história da humanidade, que passaremos a viver depois de superarmos essa enorme crise global.

 

 

 

 

 

Fonte: DIÁRIO DO GRANDE ABC

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